sábado, 6 de junho de 2009

Rostos de ontem, hoje e sempre


Foto de Fernando Cardoso
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Adolfo Correia da Rocha nasceu em S. Martinho da Anta, Vila Real, Trás-os-Montes. Teve uma vida difícil, plena e longa. Tal como merecia!
Licenciou-se em medicina, em Coimbra e além de médico, foi também escritor. Assinava as suas obras com um pseudónimo: Miguel Torga.
Se ainda estivesse entre nós teria mais de cem anos. Todavia apesar de não estar mais connosco, está-o cada vez mais. De tantas formas! Porque o evocamos tantas vezes!
Há homens assim! Estão connosco sempre, ainda que não fisicamente. Deixam-nos as suas palavras, o seu mundo interior, a sua essência. E, como sabem, a essência permanece além do que um dia fomos. Atravessa a implacável intolerância do esquecimento. Fica o sublime, aquilo que eles foram até à vertigem!
Adolfo Correia da Rocha ou Miguel Torga, o escritor, aparece-nos sempre que lho permitimos. Infinitas vezes… nas suas palavras poéticas, que nasceram dos encontros com a sua sensibilidade, com o seu sentir pleno, artisticamente. Mesmo que, por vezes, esse nascimento-renascimento tenha sido mais ou menos penoso.
Miguel Torga era um perfeccionista: procurava a palavra perfeita e sofria se não a encontrava! «Um poema, Senhor!», implorava, por vezes, como se este não aparecesse, como se se tivessem gasto as palavras ou perdido no eco que as fragas teimavam em repetir. Mas não. Ele soube colhê-las e torná-las em frutos perfeitos. Na verdade, há sempre, um «Tempo de Poesia», único, inigualável, como nos diz outro poeta de que gosto, António Gedeão.
Noutros momentos, o coração também teve de se pronunciar. Não é bom calá-lo, porquanto muito do que somos e queremos está «realmente no coração». Não importa quem, nem o quê, pode ser claridade ou um sentimento nocturno. Pode ser até que seja «Uma emoção pequenina/ [que] me vem do lado de lá», num regresso às origens.
Miguel Torga é Trás-os-Montes. O mundo da grandeza do norte, da plenitude telúrica, do anúncio da sua humanidade. Miguel Torga, despido de preconceitos, mostrou-se no amor, na tristeza, na dor, na ausência, na busca da liberdade e da justiça pelo ser humano! E, por isso, o eu chorou. São poucos os que sabem e compreendem esta aparição do sofrimento do outro a este eu atento. Talvez, porque lhes seja difícil ou mais fácil ignorá-lo. É que amar «sem tréguas» é provavelmente de mais. É pedir muito.
Se os homens se derem uma oportunidade, inevitavelmente encontrarão o seu reino para além das fragas, para que nada nem ninguém possa ter razão sobre eles. Só assim os homens podem ser maiores que tudo, reinventando-se, a cada palavra, ao sabor desta voz que, de forma miraculosa, ainda nos permite encontrar a nossa «Pedra Filosofal» (poema de António Gedeão), ou quem sabe no «Surdo murmúrio do rio» Douro ou de qualquer outro caminho!
O existencialista Vergílio Ferreira apresenta uma certeza inabalável: a morte não tem razão contra a vida. Não, de facto, não tem. Adolfo Correia da Rocha/Miguel Torga ilumina o mundo, fá-lo reaparecer e deslumbra-nos sempre – em absoluto.

1 comentário:

F Nando disse...

De Torga faço sempre a associação a Coimbra onde fiz o serviço militar, e ao ver esta estátua estou a ver a fonte de inspiração que não será uma visita ao Parque dos Poetas...
Bjs